09 maio, 2008

Espera no Procon passa de 3h30min

Queixas crescem. E espera no Procon passa de 3h30min.
Enquanto atendimentos aumentaram 80% desde 2000, número de funcionários praticamente se manteve. Desde que foi criado, em 1976, o Procon é considerado órgão de excelência na defesa do consumidor, com índice de solução de conflitos de 71% e qualidade reconhecida internacionalmente. O trabalho dos atendentes é elogiável: são educados, prestativos e precisos na análise caso a caso. A eficiência, combinada com a expansão do mercado de consumo no País, porém, começa a produzir efeito imprevisto:
em São Paulo, a espera nas filas dos postos de atendimento, como avisam os funcionários logo de cara, não dura menos de 3 horas e meia e já há quem desista de tentar pouco depois de chegar ao local. A razão é simples: a demanda não pára de subir, enquanto o número de pontos de atendimento e funcionários continua o mesmo. Desde 2000, os atendimentos aumentaram 80%, saltando de 285.227 para 515.681 em 2007. Como o número de funcionários não mudou 15 atendentes no Poupatempo da Sé, 10 em Santo Amaro e 9 em Itaquera, além de um supervisor para cada posto , a média de espera subiu.
Hoje, o tempo médio é de 3h30min nos horários de pico,entre 9 e 15 horas em dias de semana em 2005, quando foram atendidas 359.811pessoas, a média era de aproximadamente 1h30. Há dias em que, por causa da demanda, as senhas param de ser distribuídas por volta das 13 horas o expediente vai até as 19. Cada atendimento dura em média 30 minutos. “Temos consciência da demanda, reflexo do aumento na capacidade de consumo da população e até da credibilidade do Procon. Para diminuir a espera, já estamos otimizando o atendimento não presencial, para evitar
deslocamento do consumidor aos postos”, diz o diretor-executivo do Procon-SP, Roberto Pfeiffer.
No Poupatempo da Sé, há até gibiteca para “apaziguar” quem aguarda.
“É para ajudar a passar o tempo”, diz uma atendente, que, entre 9 horas e 12h30 de uma quarta-feira, havia emprestado 34 gibis a maioria, da Liga da Justiça. Para evitar longas esperas, o conselho é evitar os horários de pico. O indicado, porém, é ingrato:
“No sábado, mas se deve chegar cedo, por volta das 7 horas”, aconselha uma ouvidora. Outra orientação é arranjar um procurador para o serviço. Ou procurar o atendimento por telefone ou Internet. A maioria das queixas, porém, é feita pessoalmente. Dos 515.681 atendimentos de 2007, 317.773 foram nos postos do Poupatempo, 103.551 por telefone e 85.396 pela Internet.
“É inegável que o público acredita e confia na solução dos problemas quando vai ao Procon. Por isso, para manter a credibilidade, o órgão tem de receber atenção especial dos governantes”, diz Walter Moura, do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor.
O comerciante Sérgio Lourenço, de 38 anos, é dos que não cansam de esperar. Em quatro anos, já recorreu seis vezes ao Procon. “Tem de reclamar. Senão cada um faz o que quer”, diz ele, que da última vez chegou às 11h15 e teria de esperar 3 horas estimadas por um funcionário até o atendimento. Experiente, não se surpreendeu: já havia planejado comer feijoada perto dali e aproveitou para aparar o cabelo. Por volta das 15h50, 3 horas e 35 minutos após ter chegado, foi atendido. Caso saia vitorioso nos três processos que vai mover, receberá cerca de R$ 20.
“Vale a pena. Se não tentar agora, no futuro ficará pior para os filhos.” Irritado, o porteiro Alexandre Silvério também pensou no filho. Duas horas e meia após chegar ao Procon, desistiu de esperar tinha de pegar o caçula no colégio. Balançou a cabeça, soltou um melancólico “tento outro dia” e foi embora.
Último concurso foi em 2005
Consciente do aumento de demanda, a diretoria do Procon promete, ainda este mês, fazer remanejamentos de funções administrativas para atender mais consumidores, com o mesmo corpo funcional. Hoje são 478 vagas. “O que toma tempo dos atendentes são as peculiaridades de cada caso. Há pessoas que chegam no atendimento com quatro diferentes, com legislações próprias”, diz o diretor, Roberto Pfeiffer. Todas as contratações têm de ser feitas por concurso público o último ocorreu em 2005 e garante 34 novas vagas, mas só para reposição de aposentados. O Procon também quer, entre outras coisas, reforçar o atendimento por telefone e Internet para diminuir o tempo de espera. Para isso, promete criar, ainda este ano, outras 13 linhas de atendimento, além das 17 já existentes, por meio do 151. “Há muitos casos que podem
ser resolvidos de casa. Gradativamente, queremos otimizar o sistema on-line”, diz Pfeiffer.
Especialista sugere criação de órgão municipal
Especialistas concordam em um ponto: com a credibilidade que tem, o Procon deveria ser um órgão tratado de forma exemplar. “Com o aumento do poder de consumo dos brasileiros, é natural que surja mais esse gargalo. Cabe a um órgão renomado como o Procon, agora, oxigenar seu atendimento, principalmente online”, afirma a coordenadora da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Pro Teste), Maria Inês Dolci. “Demora no atendimento desestimula o consumidor a correr atrás de seus direitos.”
A outra ponta dessa corrente, segundo a coordenadora, também tem sua parcela de culpa. “As empresas, em geral, têm péssima qualidade no atendimento. Todos conhecem a fama dos call centers. O consumidor não agüenta esperar meia hora na linha e procura o Procon, que fica sobrecarregado.”O advogado Vinícius Zwarg, ex-diretor do Procon-SP e advogado especialista em Direito do Consumidor, afirma que a criação de um Procon municipal ajudaria. A idéia foi cogitada no início do governo José Serra (PSDB) na Prefeitura de SãoPaulo, em 2005, mas, segundo a Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos, não foi oficializado.
PROCON DO PROCON?
Mas existe alguma maneira de se queixar do atendimento no órgão responsável por atender reclamações? “É possível entrar na Justiça, mas, pelo tempo que demoraria para receber uma resposta, seria uma aberração. O mais indicado é procurar a ouvidoria do órgão e registrar queixa”, diz Zwarg, que por quatro anos dirigiu o Procon-SP e hoje é especialista em Direito do Consumidor.

28/04/08 - O Estado de São Paulo