21 dezembro, 2007

Clarice Lispector

"Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto
de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma.
Até cortar os defeitos pode ser perigoso -
Nunca se sabe qual o defeito
que sustenta nosso edifício inteiro...
Há certos momentos em que o primeiro dever
a realizar é em relação a si mesmo.
Quase quatro anos me transformaram muito.
Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas.
Você já viu como um touro castrado se transforma em boi?
Assim fiquei eu...Para me adaptar ao que era inadaptável,
para vencer minhas repulsas e meus sonhos,
tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma
que poderia fazer mal aos outros e a mim.
E com isso cortei também a minha força.
Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo
o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal,
copie você mesma - é esse seu único meio de viver.
Juro por Deus que, se houvesse um céu,
uma pessoa que se sacrificou por covardia
ia ser punida e iria para um inferno qualquer.
Se é que uma vida morna não é ser punida
por essa mesma mornidão!!
Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence
é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral.
Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo.
Gostaria mesmo que você me visse e assistisse
minha vida sem eu saber.
Ver o que pode suceder quando se pactua
com a comodidade da alma"

(Clarice Lispector)

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